Palestrante, cantor ou profeta

Nestes 53 anos de ministério sacerdotal já fui enquadrado com dezenas de rótulos. Afinal, o que eu já experimentei neste meio século de sacerdote muitos de vocês experimentam agora, como padres, leigos e leigas.

Quem fala ou canta sobre Jesus diante de uma câmera ou microfone está se expondo. Quer queiramos quer não queiramos, somos todos dados em espetáculo ao mundo. E somos ou seremos rotulados por quem nos vê ou ouve. Esperam que digamos o que querem ouvir, mas nem sempre é possível satisfazer a todos os telespectadores ou ouvintes. Jesus e os apóstolos também tinham suas profecias, suas palestras e sermões que ofereciam a quem quisesse ouvi-los.

Em João 6,64-67 Jesus respeitou quem não queria mais ouvi-lo. E deixou-os ir. Logo em seguida Jesus deixou livres os seus discípulos. Poderiam ir embora dele se quisessem. E Pedro, sempre o Pedro, perguntou a quem iriam se deixassem de seguir Jesus. E ficou. E ficaram.

Penso nos sermões e catequeses litúrgicas do cultíssimo Padre Antônio Vieira, famoso jesuíta que pregou em meados de 1640. E lembrava como se pode e se deve pregar, com conteúdos e a que auditório.

E o assunto que estou trabalhando penso que se presta a você, caro leitor. Trata-se da pregação como palestra, como canção religiosa e como liturgia e, na mesma esteira, como possível profecia.

  • Nem toda pregação exige uma canção.
  • Nem todo pregador tem o dom de cantar.
  • Nem todo cantor tem o dom de pregar.
  • Nem todo pregador ou cantor ou compositor é profeta.
  • Nem todos os profetas cantavam.
  • Não consta que Jesus fosse um cantor.
  • Não consta que os apóstolos fossem cantores.
  • Pregar é uma coisa, cantar é outra e profetizar é ainda outra coisa.
  • Se o que eu canto não é profético ainda assim será uma catequese e uma canção religiosa, mas não servirá como profecia.
  • Um é o dom de pregar, outro o dom de cantar e outro é o dom de profetizar.
  • E não sou eu quem decide se o que eu faço é profecia. Pode ser pregação e até ser canção, mas profecia é outra coisa. São dons diferentes que nem sempre estão no mesmo coração.
  • Por isso quem acha que canta bem ou toca bem ou prega bem está servindo o Senhor e à causa do Reino, mas nem por isso pode ser considerado profeta. Isto é decisão do céu e confirmação da Igreja. E não são os fãs de um padre, de um bispo, de um pregador ou de um cantor ou escritor que decidirão que há um novo profeta na Igreja.
  • Foi Jesus quem disse em Mateus 7,15-23 e Mateus 24,24-28 que viriam pseudoprofetas e pseudoapóstolos que fariam prodígios de embasbacar seu público, mas nem por isso seriam profetas aprovados por Deus.
  • Um pregador pode se proclamar pregador. E, também, um conferencista ou palestrante ou cantor podem aceitar serem chamados desta forma. Mas um profeta jamais aceitará ser chamado de profeta. No passado vários profetas se denominavam profetas, mas, hoje em dia, os novos conceitos de serviço humilde pedem que nenhum ministro ou servidor do evangelho se apresente como profeta. Se o fizer perdeu a noção da profecia. Ao menos na Igreja Católica tem sido assim!
  • Não peça a graça de ser profeta. Lemos no Evangelho, em Mateus 20,20-28, que uma mãe pediu para seus dois filhos a graça de se sentarem um à direita e outro à esquerda do reino. A resposta de Jesus foi que isto era coisa do Pai… Há dons que se pode pedir. Há outros que humildemente não se pode pedir. Mas também não se pode recusar. Jeremias e Paulo jamais pediram sua profecia nem o seu apostolado. Foram escolhidos e não conseguiram dizer não! A graça os atingiu de cheio!
  • Por isso, quando vejo um cristão dizendo que é profeta, preocupo-me com ele. Uma coisa é quando os outros nos chamam de profetas e outra quando aceitamos como se isso fosse natural. O título é dos outros, nunca nosso. A frase de Jesus deve ecoar constantemente nos nossos ouvidos: SOMOS SERVOS INÚTEIS:

Assim também vós, quando fizerdes tudo o que vos for mandado, dizei: Somos servos inúteis, porque fizemos somente o que devíamos fazer. (Lucas 17,10).

  • Muitos de vocês são pregadores, palestrantes, compositores, catequistas. Isto é muito bom. Mas se alguém de vocês foi chamado de profeta puxem a orelha de quem o ou a chamou disso e brinquem dizendo: Não faça assim comigo. Se for verdade, vai saber o tamanho dessa cruz. Se não for, também será um deslize pesado. Melhor é pedir outros dons… Fama, riqueza, sucesso e profecia não se procura. Porque se vierem você sentirá o seu peso.
  • Oremos para que saibamos distinguir os nossos dons e saber como lidar com eles. Foi Jesus quem disse que bastam as preocupações de cada dia. A maioria dentre nós não dá conta de cultivar os dons que já recebeu. Correr em busca de mais dons pode ser bonito, desde que o fiel esteja preparado para isso. Talento tem que ser multiplicado. Se não sabemos fazer isso, trabalhemos bem com os 2 ou 5 talentos que recebemos. Teremos trabalho suficiente com os dons que já recebemos.
  • Era uma vez um monge na Idade Média que queria ser um pregador famoso e um grande santo. E ele dizia isso abertamente. Um monge 30 anos mais idoso do que ele aconselhou que ele orasse também por uma tonelada de humildade. Perguntando por que, o velho monge respondeu:

 – Se você se tornar famoso e santo vai querer levitar, ser venerado em vida e aparecer mais que os outros monges. A tonelada o ajudará a continuar com os pés no chão.

Pe. Zezinho, scj.

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